John Stuart Mill e sua obra feminista
- Tatiana Mareto Silva
- 21 de fev. de 2020
- 4 min de leitura
Atualizado: 7 de mar. de 2022
No livro A Sobrinha do Marquês, Caroline Eckley menciona dois livros que foram fundamentais para ela: A Vindication of the Rights of Women, de Mary Wollstonecraft e The Subjection of Women, de John Stuart Mill. Eu li essas duas obras durante meu doutorado e recomendo ambas para quem deseja entender sobre feminismo e a luta das mulheres por direitos. No post de hoje, falaremos de John Stuart Mill e do livro The Subjection of Women, uma obra de sensibilidade ímpar que Caroline lê para Isaac na biblioteca.

John Stuart Mill nasceu na Inglaterra em 20 de maio de 1806. Foi um filósofo liberal da vertente utilitarista e inspirou-se nas obras de Jeremy Bentham. Filho de James Mill (também filósofo), recebeu criação rigorosa, não podendo conviver com jovens de sua idade. O pai pretendia criar um gênio intelectual.
Ele trabalhou por muito tempo na Companhia Inglesa das Índias Orientais, atingindo o mesmo cargo de seu pai. Aos 25 anos conheceu e apaixonou-se por Harriet Taylor, que o inspirou em muitas de suas obras. Como ela era casada, ele viveu um amor platônico e esperou por ela por muito tempo. Harriet e Mill casaram-se 20 anos depois de terem se conhecido, quando o marido dela então faleceu.
Naquela época, início do Século XIX, as mulheres não eram sujeitos de direitos plenos. Os filósofos liberais mais conhecidos que se colocavam a favor da igualdade pouco contribuíram para mudar esse cenário, pois eles defendiam, de uma forma ou de outra, a manutenção da submissão da mulher ao homem. Hobbes, por exemplo, se posicionava contra a desigualdade entre homens e mulheres em aspectos políticos e sociais, mas defendia o controle da família pelo marido (e, consequentemente, a submissão das esposas). O mesmo vale para Locke.
Esses filósofos pretendiam, em verdade, abolir as bases da monarquia em que o título era transmitido apenas pelo homem. Havia uma defesa não tão velada da superioridade masculina e da inferioridade da mulher, inclusive em seu intelecto. No âmbito público, admitiam que seria melhor para a sociedade se a mulher pudesse votar e ter mais liberdade. No âmbito privado, defendiam (ou não refutavam) a supremacia masculina.
O pensamento feminista de John Stuart Mill divergia inclusive de seu pai, que defendia a sujeição da mulher ao marido ou a outro homem da família, se ela fosse solteira. Para Mill, a igualdade das mulheres em relação aos homens não tinha o objetivo de favorecer a felicidade apenas as mulheres, mas de toda a humanidade. A desigualdade entre os sexos era errada em si mesma, e um dos maiores obstáculos à evolução humana.
Mill também se inspirou nos socialistas franceses e ingleses, como William Thompson, e nos missionários da ordem Saint-Simonian. Suas convicções feministas também se mostram em sua associação com o periódico utilitarista Monthly Repository - que publicou artigos sobre voto feminino, divórcio e o injusto tratamento dado às mulheres, de forma genérica.

Ele foi amplamente influenciado por sua musa (e depois esposa) Harriet Taylor. A extensão dessa influência, no entanto, não é clara por ter se perdido na narrativa masculina da época. John Stuart Mill teve contato direto com muitas mulheres que rompiam com os estereótipos femininos e teve um longo relacionamento com uma mulher que sofreu com o tratamento desigual entre gêneros, principalmente quanto às leis do casamento e dificuldades quanto à educação.
Eles se conheceram em 1830, e Harriet Taylor tinha apenas 22 anos. O casamento aconteceu em 1851 e Mill sempre afirmou que todos os livros mais maduros de sua autoria foram inspirados por ela. Harriet Taylor morreu em 1858, uma década antes da publicação de The Subjection of Women, mas John Stuart Mill garante que ela possuiu, também, grande contribuição nessa obra. Há muita discussão a respeito da autoria dessa obra, pois alguns críticos afirmam que The Subjection of Women foi escrito por Harriet Taylor e publicado após a sua morte por pedido da família. Mill teria dado seu nome à obra apenas para torná-la notória, o que não pode ser confirmado, no entanto.
Apesar de seu pensamento progressista em relação aos direitos das mulheres, Mill considerava a família essencial para a humanidade, e incentivava que as mulheres se casassem. Mesmo que afirmasse que as mulheres teriam direito a escolher a vida que preferissem, admitia que a maioria preferia a vida doméstica, e que isso equivalia a escolher uma carreira profissional - ou seja, a mulher casada era "do lar", assumia as funções domésticas como suas (como seu trabalho).
A mãe teria um relacionamento mais profundo com seus filhos, e nada a substituiria na educação das crianças - Mill não refletiu que essas afirmações poderiam derivar da socialização e do condicionamento. Durante o Século XIX essa discussão sobre construção cultural dos gêneros era inexistente, praticamente.
Quando John Stuart Mill publicou The Subjection of Women, as mulheres não votavam e a mulher não era um indivíduo capaz separado de seu marido. Todas as suas propriedades e dinheiro passavam para o controle do marido, que detinha poder absoluto sobre ela. A justificativa comum para esse status inferior era que as mulheres eram puras e moralmente superiores aos homens, devendo ser protegidas da influência negativa da vida pública que podia distorcer a moral das futuras gerações. No livro, Mill argumenta que trata-se de um absurdo, já que em nenhuma situação da vida o melhor deve obedecer e se submeter ao pior.
Ele também combateu, no livro, que as mulheres sejam mais emocionais do que racionais e, portanto, não tenham as capacidades intelectuais dos homens. Mill atribuiu essas diferenças à forma de criação das mulheres e afirmou que, enquanto elas não fossem criadas da mesma forma dos homens, seria impossível descobrir exatamente quais as diferenças naturais de cada sexo (naquela época também não havia uma discussão suficiente sobre as diferenças entre gênero e sexo biológico.)
Referências desse post vão para:
OKIN, Susan Moller. Women in western political thought [versão digital]. New Jersey: Princeton University Press, 2013.
MILL, John Stuart. The Subjection of Women. Londres, 1869.
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